domingo, 1 de maio de 2011

REINVENTAR A EMANCIPAÇÃO SOCIAL

Projecto possível?
REINVENTAR A EMANCIPAÇÃO SOCIAL


«A globalização trouxe coisas boas…mas impor aos países mais pobres a monocultura e a mono -produção só perpetua a pobreza destes…»

«É mais fácil a globalização duma qualquer marca do que a da carta dos direitos humanos.»
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Explicar hoje, os processos económicos, sociais, políticos e culturais das sociedades nacionais, ou apenas só fazer-lhe referência, será sempre verificar qual o papel que, nesses processos, desempenha hoje a globalização, a globalização-hegemónica !.

Mas a par da sua importância e hegemonia –e por reacção a ela - esta globalização criou outra!
Criou a globalização (vista como contraponto àquela), formada por redes e alianças transfronteiriças entre movimentos, lutas e organizações locais ou nacionais, em diversos pontos do globo. Mobilizam-se contra a exclusão social, a precarização do trabalho, o declínio das politicas públicas, a destruição do meio ambiente e da biodiversidade, o desemprego, as violações dos direitos humanos, os próprios ódios inter-étnicos produzidos directa ou indirectamente pela dita globalização-hegemónica. .

Pode pois afirmar-se que da base para o topo das sociedades nasceu uma globalização alternativa, contra-hegemónica. Ainda que recente, ainda que emergente, ela tem raízes mais velhas que a manifestação contemporânea mais consistente, até hoje realizada, com este espírito: o primeiro Fórum Social Mundial, realizado em Janeiro de 2001, em Porto Alegre (Brasil).

Se o capitalismo moderno é na sua origem um projecto de vocação global
que se desenvolveu sempre sob a forma de intensificação da globalização, por outro lado sempre houve resistências a esse projecto tão dinâmico como predador. Desde a revolta dos escravos às lutas de libertação nacional, desde as lutas operárias aos projectos socialistas, desde os movimentos anarquistas aos movimento dos não-alinhados e de outros eventos de cariz semelhante.





O que haverá de novo hoje?

Temos a intensificação exponencial das relações transfronteiriças, as novas tecnologias de comunicação e de informação com efeito profundo na “acção social”, nas suas escalas tanto espaciais como temporais.

“O local é cada vez mais o outro lado do global e, vice-versa, o global é cada vez mais o outro lado do local.”

A explosão das escalas tanto geram interdependência quanto disjunção. Nunca tantos grupos estiveram tão ligados ao resto do mundo por via do isolamento nem tantos foram integrados por via do modo como são excluídos.

E que mais haverá ainda?

A voracidade com que a globalização-hegemónica devora as promessas de progresso, de liberdade, de igualdade, de indiscriminação e da racionalidade.

Porque a regulação social-hegemónica deixou de ser feita, em nome dum projecto de futuro ,os designados projectos de emancipação social foram deslegitimados. A regulação-social é feita por impulsos, como patinando num gelo de interesses de momento (que se derrete inexoravelmente) e como tal nem chega a erguer-se ou nasce efémera.

A desordem dos mercados financeiros só vem acentuando que a a forma de regulação social seja uma metáfora e a ideia de uma “emancipação social sustentada” mera propaganda ocasional.
Paradoxalmente, dentro deste vazio de regulação e de travão à emancipação, estão surgindo, como já referimos, em todo o mundo, as reacções que consubstanciam a “globalização contra-hegemónica”. Movimentos, organizações e iniciativas diversas lutam simultaneamente contra as formas de regulação que não regulam e contra as formas de emancipação que não emancipam. (1)

Assim, e neste cenário, torna-se pertinente inquirir se poderemos reinventar a emancipação social?
Antes de encontrar resposta colocam-se, curiosamente, “pré-questões cruciais”:

* Será possível unir o que a globalização hegemónica separa e separar o que a globalização hegemónica une?
* Residirá tão só nisso a globalização contra-hegemónica?
* É possível contestar as formas de regulação social dominante e a partir daí “reinventar a emancipação social”?
* Qual a intervenção dos investigadores e estudiosos para enfrentar estes desafios?
* Terá sido fatal para a ciência política moderna e para as ciências sociais, em especial, terem abandonado o objectivo da luta por uma sociedade mais justa?

De facto por se terem estabelecido barreiras entre a ciência e a politica, entre o conhecimento e a obra, entre a racionalidade e a vontade, entre o ser e o ter, entre a verdade e a quimera, entre o participativo e o representativo; certos estudiosos e/ou cientistas, com aparente “boa consciência”, colaram-se aos poderes vigentes-hegemónicos.
E com esse fatalismo, não raro também noutras matérias, ter-se-á relegado para as calendas:

* Unir o que foi obstinadamente separado;

* Construir formas de conhecimento (e de acção) mais comprometidas com a condição humana;

e fazê-lo de modo menos eurocêntrico e menos dogmático.

O projecto é ambicioso mas é possível. Quase nos leva a pensar no axioma de Maio de 68: ”ser realista desejando o impossível”.

Como fazê-lo?

Renovando a ciência política moderna.
Mas para que essa renovação seja consistente terão de ser retiradas as barreiras antes descritas, ter-se-á que voltar a revitalizar (e a dignificar) a condição humana e a valorizar os compromissos exigidos por uma sociedade mais justa; calibrar o convívio da representatividade e da participação, activa e séria, por cada ser humano na construção do seu destino; recolocar em jogo e remoçar os princípios e valores, pró-sociais, que foram arredados ou esmagados pelos (novos e velhos) fundamentalismos de credos economicistas predadores e devastadores (dos quais a ultima e actual crise é disso exemplo).
Renovando, com estas premissas, a ciência política moderna é (e impõe-se ser) possível reinventar a emancipação social.



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Mais uma reflexão séria a fazer-se, não apenas simbolicamente nos percursos, de vai e vem, entre os nossos “Claustros” e a nossa “Madalena” mas transpondo-nos para um outro mundo (o nosso planeta) entre o local e o global e vice-versa!

Claro que este assunto nos conduz à problemática da “democracia representativa” e da “democracia participativa”.

Trecho para esta reflexão, me proponho trazer, em próximo Boletim

(1)-Fontes:

-Sakkhela Buhlungu (O reinventar a democracia participativa na África do Sul);
-Maria Clemência Ramirez (A politica de reconhecimento e da cidadania no Putumayo e na Baixa Bota Caucana -Colômbia);
-Maria Teresa Uribe (Emancipação social num contexto de guerra prolongada-Colômbia);
-João Arriscado Nunes (“Casas decentes para o povo”movimentos urbanos e emancipação em Portugal);
-Isabel Guerra (O território como espaço de acção colectiva…);
-Maria Célia Paoli (Empresas e responsabilidade social: os enredamentos da cidadania no Brasil);
Conceição Osório (Poder político e protagonismo feminino em Moçambique);
-Boaventura de Sousa Santos (Orçamento participativo em Porto Alegre: para uma democracia redistributiva);
-Leonardo Avritzer (Modelos de deliberação democrática :uma análise do orçamento participativo no Brasil);
-Patrick Heller (O perfil politico e institucional da Democracia Participativa: lições de Kerala, Índia);
-Emir Sader (Para outras democracias).

Manuel Duran Clemente Fevereiro 2010

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