terça-feira, 19 de dezembro de 2023

Jorge Sarabando

 Por Jorge Sarabando

Unicepe,16/12/23- Porto.
"A poesia representa sempre uma dádiva, a eterna busca de um outro, a quem se oferecem palavras, num modo de voz, como se foram mãos que se estendem a outras mãos.
A melhor poesia é para ser lida e deve ser lida em voz alta, para ser bem entendida e partilhada.
Talvez por isso o autor escolheu, como introito do seu livro, dois poemas, de José Régio “Não vou por aí” e de Camões, o que assim começa ”Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, certamente pelo seu significado, mas também porque renascem de cada vez que são declamados ou cantados. Como os versos, também citados, de José Carlos Ary dos Santos.
Cada poema é uma fonte de mil cores, tantas quantas quem se encanta e repete palavras escritas em épocas distantes, como se foram escritas agora, por si ou para si. Porque geraram uma cumplicidade, despertaram a vontade de uma partilha.
Mas para isso é preciso que as palavras respirem poesia, que nelas desponte e se reconheça uma voz poética. Por vezes é preciso serem lidas em voz alta para tocarem o leitor e que este reconheça o sentido de o autor as querer inscrever na pedra do tempo.
Diga-se que neste livro de Duran Clemente a voz poética não se revela logo nas primeiras páginas. É preciso caminhar no chão das palavras para que se torne reconhecível entre expressões de afecto e assomos de consciência. Como no “Abril poema”, cito
“Desatar nós.
Até ao outro. Aos outros nós.
Aos nós e nós!
Nós sem idade.
Nós sem nós.
A sonhar liberdade.”
Como no “poema mãe (Nai)”, ou no “primeiro dia”, ou no “Um dos nossos – Salgueiro Maia” ou nesse divertimento intitulado “nesta terra são muitos os Carlos”, dedicado ao seu amigo Carlos do Carmo. Como nos textos em prosa, presente na evocação de Adriano Coreia de Oliveira.
A poesia está lá.
É um modo de transcender o real, quando oprime, indigna, aprisiona, ganhar asas em busca de um outro, que nos leia ou escute. E assim nos possa acolher e entender.
Ao longo das palavras de Duran Clemente encontram-se expressões de afecto, doces e generosas, outras de inconformidade e rebeldia e uma certa agrura, que perpassa em muitas páginas. Ao longo dos textos as mulheres estão muito presentes, com louvor, encantamento ou redenção.
É tocante o seu poema à mãe, “teus olhos azuis/ ainda hoje me afagam”.
Como é belíssimo um texto de seu pai, que transcreve, numa sessão pública de homenagem, no Fundão, a uma sua irmã mais velha, no dia em que fazia cem anos, que fora como “uma segunda mãe”. É bem um hino àquelas mulheres que nem puderam aprender a ler, mas que eram a luz de uma casa, a força de uma família e abriam caminhos para a vida.
A obra encerra com o longo requerimento apresentado à hierarquia militar, ainda antes do 25 de Abril. Texto notável e surpreendente, espelha uma época e dá-nos a conhecer um carácter insubmisso.
Vale bem a pena ler este livro de Duran Clemente, como abraço de humanidade e testemunho de um militar de Abril, defensor dos seus ideais e valores." Jorge Sarabando.
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AMIGOS:
-Muito grato Jorge Saramago por tão... tuas belas e sentidas palavras...que "fizeram chuviscar, em cima deste animal/terráqueo, lágrimas antigas...e comoção forte." GRATO. Manuel Duran Clemente
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LANÇAMENTO NO PORTO no passado Sábado, com debate muito interessante. MDC

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